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segunda-feira, 9 de novembro de 2009



Número 10 – janeiro de 2002 – Salvador – Bahia – Brasil
FUNÇÕES DAS LEIS COMPLEMENTARES NO SISTEMA TRIBUTÁRIO
NACIONAL – HIERARQUIA DE NORMAS - PAPEL DO CTN NO
ORDENAMENTO
Profª Heleno Taveira Tôrres
Doutor em Direito (PUC/SP). Mestre em Direito Tributário (UFPE).
Especializado em Direito Tributário Internacional (I Universidade de
Roma “La Sapienza”). Professor de Direito Tributário Internacional no
Mestrado e Doutorado da PUC/SP e de Direito Tributário na
UNIFIEO. Advogado e Conferencista. Docente Consultor da CAPES,
para avaliação dos Cursos de Pós-Graduação (desde 1999).
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Pela exigência de aperfeiçoamento da legislação tributária, no atual
quadro de reforma do Estado, na era da fiscalidade de massa, globalização
econômica e da extrema mobilidade de pessoas, bens e riquezas, a
codificação do direito tributário ganha relevância, em vista dos anseios de uma
sempre crescente garantia da segurança jurídica do sistema.
Os fundamentos que justificam uma discussão a respeito do
aperfeiçoamento da codificação (normas gerais) são vários, o que vamos
verificando nos motivos alegados para reformas tributárias, dentre os quais
poderíamos enumerar os seguintes: i) busca de aperfeiçoamento do
ordenamento jurídico e da prática, para colocar o Fisco em sintonia com os
novos conceitos, evoluídos modelos de interpretação do direito, técnicas de
tributação; ii) condição para uma harmonização fiscal entre os países da
América Latina, presentes ou não em processos de integração; iii) maior
respeito aos direitos dos contribuintes, de modo a permitir uma relação entre
Fisco e contribuinte baseada em valores democráticos, entabulada numa
transparência fiscal, e informada pelos ditames da vinculação, clareza e
simplicidade; iv) atualização do catálogo dos limites à ação fiscal, mediante a
inserção ou ampliação do código de defesa do contribuinte; v) aperfeiçoamento
da legislação para reduzir as possibilidades de fraudes, evasões fiscais,
mecanismos elisivos e até mesmo a corrupção; vi) exigência de elementos de
2
resistência às penetrações indesejáveis de conceitos forâneos, principalmente
de common law. Esses são motivos mais que legítimos para justificar tal
preocupação.
Como corolário dessa questão, justapõe-se o tema da hierarquia
sistêmica de normas, a respeito do que temos orientação diversa do que
tradicionalmente tem sido veiculado na nossa doutrina, de menor crítica, é
claro. Entendo que toda hierarquia normativa baseia-se na exclusivamente na
competência dos órgãos responsáveis pela produção de normas no
ordenamento, porquanto um mesmo órgão pode desempenhar diversas
funções, a partir de competências distintas. Vê-se, portanto, o quanto já está
superada a pueril concepção piramidal de Kelsen. Se a validade das normas
exige órgão competente atuando segundo os ditames do ordenamento
(processo ou procedimento), será exclusivamente a identificação da
competência o elemento preciso de demarcação da posição hierárquica da
norma produzida no ordenamento jurídico.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988 trouxe um grupo de normas
muito abrangente para instituir o respectivo sistema tributário nacional, com
disposições atributivas de poder de tributar, sob a forma de competências, à
União, Estados, Distrito Federal e Municípios; além das limitações
constitucionais a essa repartição de poderes. Por isso, aparentemente, o papel
do Código Tributário Nacional (Lei 5172/66), entre nós, não tem a importância
que possui para os demais países, cujas constituições não asseguram os
pressupostos e os limites para o exercício da tributação.
Mas se o Código Tributário Nacional não desempenha esse papel de
centralidade primordial no sistema tributário brasileiro nem por isso deixa de ter
sua repercussão. A própria Constituição Federal (art. 146, III) exige que o
sistema de legislações (União, Estados, Distrito Federal e Municípios)
submeta-se às chamadas “normas gerais de direito tributário”, como forma de:
regular as limitações constitucionais ao poder de tributar, aplicando-se
estritamente àquelas que exigem lei específica para surtir efeitos (art. 146, II;
150, VI, “c”; 195, § 7º, 156, § 3º CF); ii) evitar eventuais conflitos de
competência entre as pessoas tributantes, quando deverá dispor sobre fatos
geradores, bases de cálculo e contribuintes dos impostos já identificados na
Constituição (art. 146, I e III, “a”; 155, § 2º, XII, CF); iii) definir os tributos e suas
espécies (art. 146, III, “a”, CF); iv) harmonizar os procedimentos de cobrança e
fiscalização dos tributos, tratando de obrigação, lançamento e crédito - art. 146,
III, “b”, CF; e v) uniformizar os prazos de decadência e prescrição - art. 146, III,
“b”, CF; vi) fomentar, de modo harmonizado, adequado tratamento tributário ao
ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.
Trata-se de algo fundamental, essa oportunidade de reascender
diálogos acadêmicos sobre o modelo de código tributário vigente, pelos
importantes efeitos que o movimento de codificação permite aos
ordenamentos, desde que inspirado no respeito aos direitos fundamentais1,
1 Quanto à relação entre direitos fundamentais e os códigos, ver o importante trabalho:
VALDÉS COSTA, Ramón. Los principios jurídicos fundamentales en la codificación tributaria de
América Latina. In: Revista de Direito Tributário. SP: RT, 1977, nº 3, set.-oct., p. 51-61;
3
numa forma racional de atuação e harmonização dos mecanismos de
incidência, além de outros aspectos pertinentes ao aperfeiçoamento da
legislação tributária2.
2. O CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL - FUNÇÃO INTERNA
2.1 Breve escorço histórico
O Código Tributário Nacional surge a partir da Lei nº 5.172, em 25 de
outubro de 1966, como resultado da reforma operada pela Emenda
Constitucional nº 18/65. Todavia, desde 1953, por ordem do então Ministro da
Fazenda, Osvaldo Aranha, encontravam-se instalados os trabalhos para
realizar tal codificação do direito tributário brasileiro. Para esta tarefa, foi
nomeado Rubens Gomes de Sousa, que ficou encarregado da preparação de
um anteprojeto, o qual foi apresentado em 1954. Este projeto não logrou
conversão em lei. Somente mais tarde, sob a égide daquela Emenda nº 18/65,
a partir de um outro anteprojeto redigido pela Comissão composta dos
Professores Gilberto de Ulhôa Canto, Rubens Gomes de Sousa e Gerson
Augusto da Silva (médico), que contavam com a ajuda de Aliomar Baleeiro, , tal
desiderato chegou a bom termo3.
Como se vê, a Lei nº 5.172/66 foi redigida sob a égide da Constituição
Federal de 1946, respeitando o seu art. 5º, XV, b, tendo sido recepcionado pelo
§ 1º do art. 18, da Constituição de 1967, o qual dispunha: “Lei Complementar
estabelecerá normas gerais de direito tributário, disporá sobre conflitos de
competência nessa matéria entre União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios e regulará as limitações constitucionais ao poder de tributar”. Em
seguida, o Ato Complementar nº 36, de 13/03/1967, em decorrência dos efeitos
de recepção e reconhecendo naquela lei as funções exigidas para lei
complementar, lha atribuiu a denominação com a qual atualmente a
reconhecemos, de Código Tributário Nacional.
Em face do princípio da recepção constitucional (art. 34, § 5º, dos
ADCT/CF), o Código Tributário Nacional foi mantido também pela Constituição
de 1988, em tudo o que não seja com ela incompatível, em atendimento ao
primado da economia legislativa e por estar em consonância com as exigências
do art. 146, CF, a saber:
Art. 146. Cabe à lei complementar4:
2 Na Alemanha, Klaus Tipke defende a necessidade de um Código Tributário
(Steuergesetzbuch) que inclua tanto a parte geral como os diversos impostos em espécie, o
que, segundo este prestigioso Professor, mostrar-se-ia como uma grande contribuição à
sistematização do Direito Tributário. Cfr. TIPKE, Klaus. Die Stueuerrechtsordnung, Colônia:
Otto Schmidt, 1993, v. I, p. 110;
3 Para uma análise mais apurada, cfr.: JULIANO, Raymundo. El código tributário
nacional. Anais das XX Jornadas do ILADT. Salvador: ABDF, 2000, dez., p. 1595-1607;
4 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária.SP: RT, 1975, p. 80-81;
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário, 12ª ed. SP: Saraiva, 1999, p. 206;
4
I - dispor sobre conflitos de competência, em matéria tributária, entre a
União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;
II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária,
especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos
impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos
geradores, bases de cálculo e contribuintes;
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;
c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas
sociedades cooperativas. (g.n.).
Mesmo se en passant, mas precisávamos situar o Código Tributário,
temporalmente, em nosso sistema tributário, ora superando mais de seis
lustros cumprindo as exigências constitucionais típicas. Feitas essas
digressões, passemos agora a uma análise das funções que a lei
complementar cumpre no sistema tributário nacional, para em seguida
discorrermos sobre o conteúdo e alcance das normas gerais e o papel da
codificação.
2.2 Conceito e funções da lei complementar no sistema tributário
nacional
Sabemos que todos os Estados, o Distrito Federal e os Municípios
possuem suas constituições e leis orgânicas, cada qual regendo os respectivos
sistemas de normas próprios, sob a égide dos princípios do federalismo e
autonomia dos municípios. Contudo, para a União, a mesma Constituição que
rege a República Federativa do Brasil (art. 1º, CF), regula também suas
atividades, exercidas na qualidade de pessoa jurídica de direito público interno
(art. 18, CF). Percebendo essa sobreposição, já Oswaldo Aranha Bandeira de
Mello, em 1937, na sua obra: “natureza jurídica do Estado Federal”, fizera a
necessária separação entre aquelas normas que, por se aplicarem à República
Federativa do Brasil, concentram em si eficácia vinculante para todas as
pessoas políticas, corporificando a Constituição Nacional; e aquelas normas
que se aplicam exclusivamente à União, pessoa autônoma do federalismo,
compondo a chamada Constituição Federal.
Como é de sua natureza, a Constituição institui órgãos aos quais confia,
segundo seu caráter objetivo, âmbitos de tarefas da atuação estatal distintos,
setores de competência material, portanto; além disso, define as atribuições de
poder necessárias para a adequada consecução de tais tarefas. A Constituição
funda competências, criando, no âmbito dos respectivos cometimentos, poder
estatal (conforme o direito), para que os órgãos legislativos tipifiquem as
materialidades correlatas. Dispõe, a Constituição, desse modo, a regular
composição e conformação dos órgãos estatais, garantindo a adequada
assunção de suas funções, cujos atos somente serão válidos se estes agirem
5
exclusivamente nos seus limites de competência e segundo o devido processo.
Em conformidade com este modo de ação, segue a Constituição sua
finalidade, coordenando as diferentes funções dos órgãos umas com a outras,
fazendo com que todas se complementem mutuamente, cada um agindo
segundo as regras constitucionais, de tal modo que a cooperação, a
responsabilidade e o controle entre estes restem assegurados, evitando-se
eventuais abusos de competências5 por um ou outro órgão.
Por determinação constitucional, no Brasil, o Congresso Nacional exerce
três funções legislativas (competências) distintas: é i) constituinte derivado, ao
discutir e votar Emendas à Constituição, e é o legislador ordinário da União,
sob duas modalidades: ii) legislador federal, ao exercer as competências
típicas da União, na qualidade de pessoa de direito público interno, plenamente
autônoma; e iii) legislador nacional, ao dispor sobre normas gerais aplicáveis
às quatro pessoas políticas, nas matérias previstas no art. 24, da CF, e em
outras previstas no corpo da Constituição.
Percebe-se, assim, que a Constituição atribuiu funções distintas a um
mesmo órgão legislativo, sob a forma de competências típicas: ao exercer o
poder de reforma, com poderes para alterar a fisionomia constitucional, criando
ou modificando inclusive suas próprias competências e das demais pessoas
políticas, desde que não afete as chamadas cláusulas pétreas do art. 60, IV,
CF; e como legislador ordinário, a partir das atribuições materiais de
competência, estabelecendo as tipificações das condutas, por lei específica,
bipartindo-se em legislador federal e legislador nacional6.
Como dito, o Congresso Nacional é órgão que concentra dúplice função,
e os processos exigidos para o exercício de cada uma delas são distintos, não
apenas por uma questão de necessidade de maior dificuldade, definidora da
rigidez constitucional, para o exercício das mutações constitucionais, operados
pelo Constituinte derivado, mas como razão do exercício de cada uma dessas
funções. Ao dúplice exercício de funções do órgão, um duplo processo, como
critério de legitimação dos atos emanados por cada um deles.
As leis complementares são figuras do ordenamento que se diferenciam
dos demais atos legislativos tanto pela matéria (competência), quanto pelo
processo de formação (quorum qualificado de maioria absoluta, art. 69, da CF).
Daí Paulo de Barros Carvalho as definir nos seguintes termos: “lei
complementar é aquela que, dispondo sobre matéria, expressa ou
implicitamente, prevista na relação constitucional, está submetida ao quorum
qualificado do art. 69 (CF), isto é, maioria absoluta nas duas Casas do
Congresso Nacional”.
5 Cfr.: HESSE, Konrad. Escritos de derecho constitucional. Madrid: Centro de Estudios
Constitucionales, 1992, p. 19;
6 “O processo crescente de complexidade da evolução social impõe a divisão do
trabalho, a especialização de funções. Já as funções F’, F”, F’”, não são comportáveis num
único órgão O. Fragmenta-se o exclusivo órgão, destacando-se outros, cada um com função
específica”. VILANOVA, Lourival. Causalidade e relação no direito. Recife: OAB, 1985, p. 192;
6
Dito de outro modo, as leis complementares encontram no sistema
constitucional o respectivo campo material predefinido (competência), sob a
forma de matérias sujeitas ao princípio de reserva de lei complementar
(pressuposto material) e são aprovadas por maioria absoluta (pressuposto
formal, art. 69, CF). Eis o quanto as diferem das leis ordinárias.
No Brasil, a Constituição, como corolário do federalismo (art. 1º e 18,
CF) e da autonomia dos municípios (art. 18 e 29, CF), fixou todas as
competências, inclusive as que versam sobre matéria tributária, autorizando
aos legisladores das pessoas de direito público interno a criarem, por meio de
leis próprias, os tributos que lhes foram reservados, privativamente, de forma a
concretizar o federalismo fiscal.
Nas atividades típicas de legislador ordinário “federal”, o Congresso
Nacional poderá usar tanto de lei ordinária, como de lei complementar, a
depender da exigência constitucional para o respectivo exercício de
competência. É dizer, na Constituição encontramos matérias com reserva de lei
complementar, sendo esta exigida expressa ou implicitamente. Por conta disso,
torna-se, o procedimento do artigo 69, da CF, pressuposto de validade
inafastável para legitimar, em termos formais, o exercício do poder legislativo.
Salvo estas hipóteses, todas as demais matérias, submetidas à reserva de lei,
poderão ser objeto de leis ordinárias, como é o caso das competências do
artigo 21, 22, 23; 153, I-VI, da CF, dentre outros.
Retomando a idéia anterior sobre as funções do legislador ordinário,
temos que a lei complementar tanto é exigida pela Constituição para servir ao
legislador federal (efetivando competências da União), quanto ao legislador
nacional, na função de criar as chamadas “normas gerais”. É dizer, faz parte da
demarcação de competências, também, a definição daquelas que só poderão
ser exercidas exclusivamente pelo legislador federal (União) mediante lei
complementar, assim como a competência do legislador nacional, também
mediante lei complementar, para criar as chamadas normas gerais em matéria
de legislação tributária.
Desse modo, apreciando as hipóteses de cabimento de lei
complementar em matéria tributária, temos que, no ordenamento constitucional
vigente, são matérias de reserva de lei complementar, em duas das funções
legislativas do Congresso Nacional:
1) O exercício de competência da União (lei complementar federal), a
qual se subdivide em:
i) exercício de competências privativas específicas: arts. 148; 153, VII,
CF; e
ii) exercício de competência residual – arts. 154, I; 195, § 6º, CF;
2) A criação das normas gerais em matéria de legislação tributária (lei
complementar nacional – art. 24, I e 146, CF), as quais se encontram
expressas nas seguintes possibilidades:
7
i) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar,
restritamente àquelas que exigem lei específica para surtir efeitos (art. 146, II;
150, VI, “c”; 195, § 7º, 156, § 3º CF);
ii) evitar eventuais conflitos de competência entre as pessoas
tributantes, quando deverá dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo e
contribuintes dos impostos já identificados na Constituição (art. 146, I e III, “a”;
156, III; 155, § 2º, XII, CF);
iii) definir os tributos e suas espécies (art. 146, III, “a”, CF);
iv) harmonizar os procedimentos de cobrança e fiscalização dos
tributos, tratando de obrigação, lançamento e crédito (redução de divergências)
- art. 146, III, “b”; 155, § 2º, XII, CF;
v) uniformizar os prazos de decadência e prescrição - art. 146, III, “b”,
CF; podendo estipular suas exceções;
vi) fomentar, de modo harmonizado, adequado tratamento tributário ao
ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas;
2.2.1 Lei complementar como pressuposto para o exercício de
competências da União (legislação federal)
A primeira função desempenhada pelas leis complementares no sistema
tributário é de ordem federal e corresponde, ao exercício de competência da
União para a criação de seus tributos originariamente atribuídos. Como se
sabe, a competência legislativa tributária equivale à parcela do poder de
tributar, previamente limitada, predisposta às pessoas políticas para criarem,
por meio de lei, normas jurídicas sobre tributos, quanto à instituição,
arrecadação e fiscalização destes. Pois bem. A União recebeu competências
materiais que somente podem ser exercidas mediante o uso de leis
complementares, como é o caso do empréstimo compulsório (art. 148, CF) e
do imposto sobre grandes fortunas (art. 153, VII, CF).
Além dessa hipótese, a União recebeu, por disposição constitucional
expressa, a chamada competência residual (art. 154, I; e 195, § 6º CF), para
criar novos impostos, desde que sejam não cumulativos e não tenham fato
gerador ou base de cálculo próprios dos já existentes, ou novas contribuições,
ao prever que a União poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a
manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art.
154, I.
Em ambos os casos, o exercício da competência somente será legítimo
se acompanhado de lei complementar, por ser matéria reservada tipicamente
para essa espécie de lei. Da mesma sorte da anterior, exercida a competência,
quer dizer, instituído o tributo, sua função cessa, ingressando no sistema
jurídico nacional no mesmo plano das leis ordinárias e mantendo-se, assim, em
relação de coordenação com estas. Nesse caso, não há que se falar em
qualquer hierarquia entre a lei complementar e os demais atos legislativos,
8
porquanto sua função exaure-se com a instituição do tributo, cessando com o
próprio exercício de competência. Por conseguinte, nada impede que lei
ordinária modifique ou mesmo ab-rogue lei complementar com tais funções.
2.2.2 Lei complementar como pressuposto para a criação de
normas gerais (competência da União para instituir legislação nacional)
Quanto à definição do que sejam as chamadas “normas gerais”, o certo
é que, até o presente, nenhuma doutrina foi suficientemente rigorosa a ponto
de colocá-la no devido lugar do sistema jurídico. Lembraria, no limiar desses
esforços, o trabalho pioneiro de Carvalho Pinto, que ensaiou uma delimitação
pela negativa, i.e., do que não seriam normas gerais, ontologicamente, nos
seguintes termos: a) não são normas gerais as que objetivem especialmente
uma ou algumas dentre várias pessoas congêneres de direito público,
participantes de determinadas relações jurídicas; b) não são normas gerais as
que visem, particularizadamente, determinadas situações ou institutos jurídicos,
com exclusão de outros, da mesma condição ou espécie; c) não são normas
gerais as que se afastem dos aspectos fundamentais ou básico, descendo a
pormenores ou detalhes7. Ao que nos afigura, nenhuma obra mais recente foi
suficientemente capaz de refutar essa orientação.
Contudo, mesmo havendo essa lacuna no plano semântico, o que se
deve em grande parte à ambigüidade do termo “geral”, muito já se escreveu
tentando conferir a esta figura contornos bem precisos em termos analíticos, de
sorte a garantir a segurança jurídica do sistema como um todo e a colaborar
com a delimitação da competência da União nesse assunto, preservando os
direitos dos contribuintes e evitando a invasão de competências, para os fins
de proteção do federalismo e da autonomia dos municípios, além de outros
princípios do sistema tributário nacional. E todas as discussões começaram a
partir da própria Constituição Federal de 1967.
Analisando o art. 18, § 1º, CF/67, quanto ao seu alcance e função, duas
correntes de opiniões distintas passaram a disputar espaço acadêmico. Uma
primeira, entendendo que tal dispositivo manifestaria três distintas funções para
a lei complementar: a) emitir normas gerais de direito tributário; b) dispor sobre
conflitos de competência entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios; e c) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar. É a
chamada corrente “tricotômica”.
Outra vertente de pensamento, todavia, e a que mais prosperou
doutrinariamente, deu orientação diversa à questão, alegando que aquela visão
tricotômica pecaria por praticar uma hermenêutica literal, ao não delimitar o
conteúdo das normas gerais de direito tributário, o que possibilitaria ao
legislador da União cometer agressões ao sistema federativo e ao princípio da
autonomia dos municípios, na medida que ficaria permitido à legislação
complementar produzir, indiscriminadamente, regras jurídicas que
perpetrassem o recinto das competências outorgadas aos Estados-Membros,
atingindo o pacto federativo, e invadissem as prerrogativas constitucionais de
7 CARVALHO PINTO. Normas gerais de direito financeiro. SP: Ed. Prefeitura do
Município de São Paulo, 1949, p. 24;
9
que usufruem os Municípios, maculando o princípio da autonomia dos
municípios. Ademais, porque os direitos fundamentais dos contribuintes não
poderiam ser reduzidos no respectivo alcance e conteúdo, a título de “dispor
sobre limitações constitucionais ao poder de tributar”. Como visto, a prevalecer
tal entendimento, aquele da corrente tricotômica, tudo estaria permitido ao
legislador complementar, o que decerto não se compatibilizaria com toda a
estrutura do sistema implantado pela própria constituição.
Esta orientação, chamada de “dicotômica”, pautando-se numa
compreensão sistemática, dizia que o dispositivo em análise teria apenas uma
finalidade: as leis complementares serviriam para veicular unicamente normas
gerais de direito tributário, que exerceriam duas funções: i) dispor sobre
conflitos de competência entre as entidades tributantes e ii) regular as
limitações constitucionais ao poder de tributar. Com isso, ficariam
resguardados os princípios do federalismo e da autonomia dos Municípios8.
Mas como as competências são todas privativas e já estão distribuídas e os
direitos e garantias constitucionais não poderiam sofrer coarctações pelo
legislador infraconstitucional, então sobraria muito pouco espaço para ser
regulado pelas chamadas “normas gerais de direito tributário”. Melhor dizendo,
nenhum espaço, na opinião de Geraldo Ataliba, seu maior defensor.
Mais recentemente, Valdir de Oliveira Rocha ensaiou uma definição de
normas gerais, no seguintes termos: normas gerais em matéria de legislação
tributária são preceitos meramente didáticos, desenvolvedores do sistema
constitucional, e que, no máximo, funcionam supletivamente cedendo diante de
norma específica quando ocupem espaço a esta reservado. Segundo este
autor, as normas gerais, nada obstante a grave importância didática, não
seriam estritamente necessárias, do ponto de vista jurídico9. Essa tese
encontra-se na linha do quanto já vinham afirmando grandes nomes do nosso
direito tributário, como Rubens Gomes de Sousa. Mas essa visão
declarativista, digamos assim, do que diz a Constituição Federal, é missão
própria do legislador, em qualquer esfera do seu exercício de competências.
Mesmo se, negando a corrente tricotômica, pela superficialidade de sua
conclusão, reconheçamos maior legitimidade na força argumentativa na
chamada corrente dicotômica; por entendê-la, de certo modo, redutora demais
em suas propostas, preferimos ir além dessa concepção, mesmo se a
adotemos nos fundamentos. Na medida que a Constituição Federal exige tais
normas gerais no sistema, a estas temos que reservar algum papel, porque
como é de uso corrente dizer, para fins hermenêuticos, a Constituição não usa
palavras inúteis.
De fato, adotamos na concepção de base de nossas investigações a
corrente denominada dicotômica, cuja definição das normas gerais de direito
8 BORGES, José Souto Maior. Lei complementar tributária.SP: RT, 1975; ATALIBA,
Geraldo. Lei Complementar em Matéria Tributária. Revista de Direito Tributário. SP: RT, 1989,
nº 48; CARVALHO (1999, p. 205); CARRAZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional
Tributário, 10ª ed., SP: RT, 1997, p. 474-95;
9 Cfr. ROCHA, Valdir de Oliveira. Determinação do montante do tributo – qualificação,
fixação e avaliação. 2ª ed., SP: Dialética, 1995, p. 89 e 93;
10
tributário, na visão do eminente Prof. Paulo de Barros Carvalho, Titular da PUC
e da USP, à luz da Constituição Federal de 1988 continuaria sendo a seguinte:
“(...) são aquelas que dispõem sobre conflitos de competência entre as
entidades tributantes e também que regulam as limitações constitucionais ao
poder de tributar. Pronto: o conteúdo está firmado. Quanto mais não seja,
indica, denotativamente, o campo material, fixando-lhe limites. E como fica a
dicção constitucional, que desprendeu tanto verbo para dizer algo bem mais
amplo? Perde-se no âmago de rotunda formulação pleonástica, que nada
acrescenta” 10. Pois bem, não negamos que assim seja, nos fundamentos, mas
preferimos explicitar suas possibilidades, caso a caso, à luz das teorias da
codificação, no que tange às funções representadas em cada uma das
hipóteses do art. 146, da CF.
É certo que na maioria dos grandes autores que se dedicaram ao estudo
das “normas gerais”, sempre prevaleceu uma visão mais analítica, estrutural, e
menos funcional na sua descrição, excetuando-se Sacha Calmon, quando
afirma: “as normas gerais de direito tributário veiculadas pelas leis
complementares são eficazes em todo o território nacional, acompanhado o
âmbito de validade espacial destas, e se endereçam aos legisladores das três
ordens de governo da Federação, em verdade, seus destinatários. A norma
geral articula o sistema tributário da Constituição às legislações fiscais das
pessoas políticas (ordens jurídicas parciais). São normas sobre como fazer
normas em sede de tributação”11. A nossa proposta, decerto, é partir da
estrutura para chegar à função, privilegiando a ambos os modos de
abordagem.
Nesse particular, a lei complementar deverá ser adotada pela União
como instrumento inafastável para exercer suas respectivas competências na
criação de “normas gerais”. Numa leitura sistemática do art. 146, que é regra
típica de Constituição Nacional, “normas gerais” somente serão aquelas que
venham a ser criadas seguindo tal espírito; quando o legislativo da União,
revestindo-se das magnas funções de legislador nacional, as introduzirá no
ordenamento para: i) regular limitações constitucionais ao poder de tributar,
detidamente àquelas que exigem lei específica para surtir seus efeitos; ii) evitar
conflitos de competência entre as pessoas tributantes, ao dispor sobre fatos
geradores, bases de cálculo e contribuintes dos impostos já identificados na
Constituição; iii) definir os tributos e suas espécies; iv) harmonizar os
procedimentos de cobrança e fiscalização dos tributos, tratando de obrigação,
lançamento e crédito; e v) uniformizar prazos de decadência e prescrição; vi)
fomentar, de modo harmonizado, adequado tratamento tributário ao ato
cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.
Mas é claro que a todas essas funções aplicam-se limitações
principiológicas e formais próprias, como estabelecido na Constituição Federal,
sendo totalmente afastada qualquer possibilidade para que as normas gerais
10 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário, 13ª ed. SP: Saraiva, 2000,
p. 208;
11 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 2ª ed., RJ:
Forense, 1999, p. 109;
11
assumam feições tipicamente de normas constitucionais, sob pena do vício
insanável de inconstitucionalidade; do mesmo modo que será o exercício dos
legisladores ordinários sem observância dos seus preceitos.
2.2.2.1 As funções da lei complementar como veículo de normas
gerais
Primeiramente, a competência da União para criar normas gerais com a
função de regular limitações constitucionais ao poder de tributar, somente
poderá ser exercida nos casos que exigem lei específica para surtir os efeitos
que lhe são próprios, como se verifica no art. 150, VI, “c” ou do art. 195, § 7º.
Nenhuma redução poderá ser intrudida nas limitações principiológicas cujo
exercício a Constituição não condiciona a qualquer ato do legislador, como o
princípio da capacidade contributiva, da vedação de confisco, isonomia e
outros.
Poderá a União instituir normas gerais para evitar eventuais conflitos de
competência entre as pessoas tributantes. Mas nesse caso, jamais poderá
agredir a repartição constitucional de competências, pertinente ao federalismo
e à autonomia dos municípios. Por isso mesmo, o art. 146, III, “a”, ao prever a
criação de normas gerais para dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo
e contribuintes dos impostos já identificados na Constituição, estas somente
serão constitucionais se comparecerem no sistema para especificar os limites
do inciso I, i. e., para prevenir conflitos de competência entre as pessoas
políticas. E vice-versa, pois a título de evitar conflitos de competência, não
poderá a União dispor sobre outros aspectos além daqueles. Esse é o caso
dos arts. 146, I e III, “a”; 156, III; 155, § 2º, XII, todos da CF. É evidente que a
limitação de que se fala aqui não aparece apenas nas relações entre pessoas
políticas distintas, podendo ocorrer entre Estados (ICMS: 155, § 2º, XII; ITCMD:
155, III) ou entre municípios (ISS: 156, III), daí a exigência de lei complementar
para esses casos, insulando-se aos casos expressos na Constituição, ou
quando não expresso nos dispositivos próprios; naqueles acima referidos, no
art. 146, III, “a”, para dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo e
contribuintes. Por fim, não é demais lembrar, essa é hipótese que se aplica
apenas aos impostos já previstos na Constituição originária.
A União recebe ainda competência para definir os tributos e suas
espécies (art. 146, III, “a”, CF). Para essa possibilidade, a norma geral deverá
ater-se aos caracteres gerais, tipificando as características dos tributos, nas
suas várias espécies. Nessa hipótese, a União limita-se mutuamente, tal qual
as demais pessoas políticas, porquanto ao tecer os elementos caracterizadores
do empréstimo compulsório, da contribuição de melhoria, contribuição de
intervenção no domínio econômico, taxa de exercício de poder de polícia, ou
taxa de serviço, por exemplo, disporá limitações e exigências que concorrerão
para ampliar as limitações ao poder de tributar. Nesta função, serão
inconstitucionais todas aquelas normas gerais que visem a qualificar,
particularizadamente, específicas situações com exclusão de outras; ou que se
afastem dos aspectos fundamentais ou básicos, descendo a pormenores ou
detalhes e que impliquem interferências nas competências alheias.
Na seqüência, temos que compete à União, na qualidade legislador
12
nacional, harmonizar os procedimentos de cobrança e fiscalização dos tributos,
tratando de obrigação, lançamento e crédito - art. 146, III, “b”; 155, § 2º, XII,
CF; e ainda uniformizar os prazos de decadência e prescrição. Decerto que a
própria Lei Complementar poderá dispensar específicos tributos do regime
geral, adotando prazos distintos, mas somente lei complementar terá essa
faculdade. A razão é que tanto este quanto o anterior, ambos encontram-se
fundados na premissa de que a Constituição deve primar pela redução de
divergências. É o que se dessome do art. 151, I, ao vedar a União de instituir
tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique
distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a
Município, em detrimento de outro. Mesmo sendo um dispositivo que
aparentemente seria aplicável apenas à União, na instituição de seus tributos,
não poderíamos deixar de considerá-lo no exercício da competência em
matéria de normas gerais. Por decorrência, temos que serão inconstitucionais
quaisquer leis editadas a título de normas gerais que caiam em particularismos
ou que se afastem dos aspectos fundamentais ou básicos, descendo a
pormenores ou detalhes, pelo risco de implicar em interferências nas
competências alheias. Vale ressaltar que para esses aspectos, as normas
gerais serão sempre vinculantes para todas as espécies de receitas públicas
qualificadas como tributo, às quais deva ser aplicado o regime jurídico
tributário.
Por fim, merece destaque o preceito segundo o qual cabe à lei
complementar o papel de fomentar, de modo harmonizado, adequado
tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades
cooperativas, mediante o uso de normas gerais. Nesses termos, dada a
importância e o interesse social envolvido12, e porque qualquer tratamento
tributário concedido em regime geral às cooperativas, na medida que elas
podem ter como objeto fornecer bens ou prestar serviços, poderia implicar em
afetação a tributos estaduais ou municipais, não se limitando aos tributos
federais, somente lei complementar, na qualidade de veículo introdutor de
normas gerais, teria o condão de estipular condições harmonizadas de
tributação. Sendo assim, a legislação preexistente, pertinente ao tratamento
jurídico-tributário conferido ao ato cooperativo, ao ser alçada à condição de
norma geral, somente poderá ser alterada por lei complementar, mas apenas
12 Como se dessome da própria Constituição Federal, em diversos artigos, como
exemplo:
Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado
exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este
determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. (...) § 2.º A lei apoiará e
estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo.
Art. 187. A política agrícola será planejada e executada na forma da lei, com a
participação efetiva do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem
como dos setores de comercialização, de armazenamento e de transportes, levando em conta,
especialmente: (...) VI - o cooperativismo;
Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o
desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado
em lei complementar, que disporá, inclusive, sobre: (...) VIII - o funcionamento das cooperativas
de crédito e os requisitos para que possam ter condições de operacionalidade e estruturação
próprias das instituições financeiras.
13
naquilo que for de matéria tributária13. Vedado, contudo, a concessão de
isenções (totais ou parciais) por esse meio, haja vista as limitações dos artigos
150, § 6º e 151, III, da CF.
2.2.3 A hierarquia da lei complementar na função de veículo de
normas gerais – posição do CTN no sistema de fontes
Mencionadas as funções que a lei complementar poderá desempenhar
para os fins de introduzir normas gerais no sistema tributário vigente,
passamos a cuidar da posição hierárquica que essas normas devem ocupar na
escala normativa. E como já salientamos, a relação hierárquica que
eventualmente possa existir entre lei complementar e as leis ordinárias, ou
mesmo outras leis complementares, dependerá, tão-só, da função que ela
exerça no sistema, i.e., das competências. E assim, caso a função seja
constitutiva de algum fundamento de validade, formal ou material, a lei
complementar sempre terá prevalência sobre qualquer outra lei.
Como dito acima, às normas gerais aplica-se também o primado da
reserva de lei complementar, e pelas funções pertinentes à “Constituição
Nacional”, impõe-se a necessária preeminência dessas leis complementares
em relação às demais leis, mesmo que complementares, quando tenham por
objeto o exercício de competência para instituição de tributos. Por conseguinte,
prevalecerão, sempre, sobre a legislação federal, estadual distrital ou
municipal, na medida que estas legislações passam a ter que admiti-las (as leis
complementares que veiculam normas gerais) como fundamento de validade
material.
Corolário dessa conclusão, somente lei complementar, na função de
“norma geral”, poderá revogar uma outra “norma geral”. Não basta ser lei
complementar, portanto. É preciso que esteja dirigida para o fim de modificar a
norma com essa função no ordenamento. Como exemplo, mesmo que o
imposto sobre grandes fortunas seja instituído, o que é reserva de lei
complementar, caso esta traga prazos próprios de decadência e prescrição,
diversos, portanto, do quanto se encontra no CTN, será inconstitucional nesse
particular.
Evidente, pois, que não estando a razão de hierarquia na vigência ou na
eficácia da norma, a única posição questionável será aquela do plano da
validade. Por isso mesmo, tomando em conta a natural submissão do Código
aos preceitos constitucionais, independentemente de se tratar de uma lei
ordinária14, a Lei nº 5.172/66, enquanto “lei nacional15” que é, naquilo que for
13 Nesse sentido, também: BECHO, Renato Lopes. Tributação das cooperativas. SP:
Dialética, 1998, cap. 9;
14 BORGES (1975, p. 54 e ss.); AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro, SP:
Saraiva, 1997, p. 163;
15 No dizer de Geraldo Ataliba, “Basta deixar afirmado que o Código Tributário Nacional
é uma lei nacional e não uma expressão do Poder Legislativo da União, enquanto ordem
jurídica parcial – central, mas sim expressão da ordem jurídica nacional – global. Portanto, é
uma lei que não cria tributos, que não está comprometida com os poderes da União, é uma lei
que não cria tributos, que não está comprometida com os interesses da União, é uma lei de
14
fundamento de validade material para a construção da legislação do “sistema
tributário nacional”, terá preeminência sobre todas as demais leis, ordinárias ou
complementares, não importa, elaboradas por qualquer uma das pessoas
políticas.
Não há relevância para a discussão sobre ser o CTN uma lei ordinária, e
não complementar, como exigido por esse artigo, na medida que o art. 34, § 5º,
dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, lhe garantiu força de
recepção, alçando-a ao patamar funcional de sobrenorma, em matéria de
legislação tributária, somente podendo ser revogada, a partir de então, por lei
complementar, nos moldes do art. 146, quando instituída exclusivamente para
essa função. É dizer, a partir da Constituição Federal de 1988, qualquer
dispositivo do CTN somente poderá ser modificado por lei complementar
dirigida especialmente para esse fim, pelo princípio da reserva de lei
complementar referida no art. 146.
E repare-se bem: a Constituição Federal não fala mais em normas
gerais de “direito tributário”, como constava da constituição anterior, mas
normas gerais “em matéria de legislação tributária”. A razão disso é que as
normas gerais “de direito tributário” (como um todo), cujo subsistema marca as
competências e define os princípios aplicáveis, são de natureza
exclusivamente constitucional – são as normas que instituem o sistema
tributário nacional, portanto; ficando as regras sobre a delimitação das regrasmatrizes
de incidência dos tributos, faculdades da administração,
procedimentos de lançamento, de constituição, suspensão e extinção do
crédito, decadência, prescrição etc, qualificadas como “normas gerais em
matéria de legislação tributária”.
Feitas essas considerações sobre as funções da lei complementar e a
posição formal do CTN no direito interno, mister discorrer agora sobre o papel
dos códigos, a respeito da segurança jurídica e outros princípios decorrentes,
por ser este também o papel das normas gerais.
3. CODIFICAÇÃO DO DIREITO TRIBUTÁRIO COMO PARADIGMA
SISTÊMICO PARA O CONTEÚDO DAS NORMAS GERAIS
Como é de entendimento universal, o processo de codificação consiste
numa tentativa de ordenar, mediante uma sistematização racional, a unidade
essencial de um determinado ramo do direito. Por isso, o mundo dos códigos é o
mundo da busca pela segurança, traduzida numa seqüência de capítulos e
artigos e consolidando os valores mais relevantes que a sociedade quer ver
preservados sobre uma dada matéria. Tudo sob a égide do espírito
constitucional que deve reger todo o sistema.
A codificação envolve vários princípios importantes os quais, em grande
parte, correspondem ao processo de positivação de diversos princípios e
interesse nacional, acima das esferas parciais federal, estadual e municipal”. SOUSA, Rubens
Gomes; ATALIBA, Geraldo; CARVALHO, Paulo de Barros. Comentários ao Código Tributário
Nacional (parte geral), 2ª ed., SP: RT, 1984, p. 78;
15
regras constitucionais, prestando-se à tarefa de garantir um razoável teor de
estabilidade e segurança às relações jurídicas e atos de criação de normas no
sistema.
Em matéria tributária, esta garantia dada aos valores dominantes
significa estabilidade para o cálculo sobre o futuro, por meio de uma absoluta
previsibilidade de condutas devidas pelos detentores de competência
legislativa, na elaboração da legislação tributária, bem como pelas autoridades
administrativas e particulares nos atos de aplicação do direito tributário.
Bem sabemos que a experiência jurídica dos diversos países não é
uniforme e que precisamos sempre ter bem claras tais diferenças. A começar
pela análise constitucional de cada um deles. E nesse particular, tanto vamos
encontrar países cuja forma de estado é unitária, o que é a maioria dos casos,
como países organizados sob a forma de uma federação. Essas são
peculiaridades que influenciam por demais a necessidade e o papel de um
código tributário, predisposto para conferir maior certeza do direito, pela
redução das divergências de tratamento. E aqui surge o primeiro fundamento
para a sua necessária posição de superioridade hierárquica no sistema em
relação às demais leis, na medida que serve como fundamento de validade
material destas.
Como a maioria dos países não dispõe de uma constituição analítica em
matéria tributária, antes, trazem pouquíssimas disposições a respeito,
normalmente os princípios consagrados de maior realce, como princípio da
reserva de lei em matéria tributária, isonomia, capacidade contributiva, nãoconfisco,
apenas para citar os mais freqüentes, resta para o Código a suma
tarefa de ordenar os princípios basilares do sistema, dispor o estatuto dos
contribuintes, instituir tanto os limites do Legislador, nos atos de criação de leis,
quanto os da Administração, no que tange às formalizações de obrigações
tributárias, fiscalizações e cobranças de créditos, bem como todos os demais
procedimentos formais16.
Por essa razão, dizia Valdés Costa: “a enumeração dos princípios
fundamentais de direito que devem ser recolhidos nos Códigos Tributários não
é certamente rígida, nem unanimemente compartilhada. A meu ver, em razão
de sua universalidade e importância, sob o aspecto jurídico, podem resumir-se
em quatro princípios: igualdade das partes, legalidade, jurisdicionalidade ou
tutela jurisdicional e igualdade dos contribuintes, em face dos encargos
públicos. Esta enumeração não pretende ser taxativa, uma vez que existem
outros princípios de grande importância, como o do devido processo e o da
culpabilidade em matéria punitiva e o da capacidade contributiva, recolhido em
16 “Todo proceso codificador, y consiguientemente también el tributario, se caracteriza
por dos notas: primero, reduce a unidad lo que estaba disperso; y segundo, como derivación
lógica de lo anterior, proporciona seguridad a sus destinatarios”. GANZÁLEZ GARCÍA,
Eusebio. Los principios generales de la imposición y la codificación tributaria. Anais das XX
Jornadas do ILADT. Salvador: ABDF, 2000, dez., p. 1644;
16
tantas constituições”17.
Para o Direito Tributário, o princípio da centralidade18 reserva-se à
Constituição, que dispõe as regras gerais de direito tributário, instituindo o
sistema tributário da respectiva nação e preservando o respeito àqueles direitos
fundamentais referidos19. Mas numa expansão concêntrica, o fenômeno da
codificação deve concretizar-se como uma continuação sistêmica da
Constituição, respeitando todo o conteúdo desta e condensando os preceitos que
consistam em critérios de validade material e formal para a criação das demais
normas do sistema total20. Mormente quando se trata de sistemas dotados de
uma Constituição analítica em matéria tributária, como é o caso do Brasil.
Destarte, sob a égide constitucional, um código em matéria tributária deve
ter como objetivo a sistematização de todo o esquema dos procedimentos de
tributação21, a coordenação dos distintos tributos e a regulação dos direitos dos
contribuintes22 no campo dos procedimentos, como uma parte geral da
17 VALDÉS COSTA, Ramón. A codificação tributária na América Latina. In: MACHADO,
Brandão (Coord.) Direito Tributário – estudos em homenagem ao Prof. Ruy Barbosa Nogueira.
SP: Saraiva, 1984, p. 251;
18 ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Da codificação – crônica de um conceito. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 148;
19 O melhor estudo comparado sobre os princípios constitucionais de direito tributário
encontra-se em: UCKMAR, Victor. Princípios comuns de direito constitucional tributário. (trad.
por Marco Aurélio Greco) 2ª ed., SP: Malheiros, 1999, 145 p.;
20 Com esta finalidade, estatui critérios materiais de aplicação do direito, na criação
positiva de normas gerais e concretas ou gerais e abstratas (legislação tributária), pelo
legislador, ou individuais e concretas, pelos agentes administrativos (lançamentos tributários,
autos de imposição de multas etc);
21 Sobre as vantagens oferecidas pela codificação para o direito tributário, e em
especial ao mecanismo de lançamento tributário (norma individual e concreta), disse Vanoni:
“a) dal punto de vista formale, si attua un ordinamento armonico dell’amministrazione, cui
consegne la possibilità di utilizzare rispetto a più tributi la stessa attività amministrativa e di
ridurre al minimo i doveri ausiliari del singolo (...); b) dal punto de vista sostanziale, si eliminano
le contraddizioni e le descontinuità tra i vari instituti d’imposta, riducendo le divergenze e quelle
realmente imposte dalla realtà delle cose; c) la futura legislazione fiscale resta notevolmente
semplificata. La parte generale tende a porsi come ordinamento formale del rapporto tributario
non facilmente modificabile. Il legislatore, in occasione della introduzione di nuove imposte o
della variazione delle esistenti, non è più chiamato ad occuparsi dello svolgimento del rapporto
d’imposta, ma unicamente delles caratteristiche sostanziali del nuovo tributo. Per lo svolgimento
formale servono gli schemi predisposti nella parte generale; d) la giusrisprudenza trova quel
sostegno e quella guida logica che la molteplicità dei testi legislativi regolanti situazioni
analoghe rispetto a tributi diversi lascia spesso desiderare (...). e) la scienza del diritto tributario
viene indirizzata più decisamente a lasciare le sterili vie del commento delle singole leggi, per
volgersi alla elaborazione dogmatica degli istituti giuridici di imposta”. VANONI, Enzo. Il
problema della codificazione tributaria. Rivista di Diritto Finanziario e scienza delle finanze,
Milano: Giuffrè, 1938, I, p. 448; Mas tudo isso pode ser resumido em três aspectos básicos,
como menciona Sainz de Bujanda: “Una reforma que se proponga obtener un
perfeccionamiento del ordenamiento fiscal vigente tiene que actuar en una triple dirección: 1º
Sistematización formal de los instrumentos de imposición; 2º Coordinación de los distintos
impuestos, y 3º Refundición de las normas que reglamentan cada tributo”. SAINZ DE
BUJANDA, Fernanda. Hacienda y derecho. Madrid: IEP, 1975, p. 57;
22 “Contrariamente a la creencia popular predominante en nuestro medio, el Código
Tributario no es el Código de la Administración Tributaria, es más bien la norma que regula las
17
legislação tributária, pressupondo o mecanismo de funcionamento do direito
tributário, sua linguagem, seus conceitos e sua terminologia.
A especialidade da matéria tributária exige essa expansão às normas
gerais, como uma pauta para delimitar o espaço da própria juridicização, i.e., a
escolha política de condutas para que, mediante leis, possam fazer parte do
catálogo de condutas reguladas pelo direito, mediante a lógica da definição de
hipóteses de incidência e atribuição de efeitos típicos, por imputação deôntica.
Com isso, o legislador fica ainda mais coarctado na sua atividade de produtor
de regras inovadoras do ordenamento jurídico, pois além de dever obediência à
Constituição, às “normas gerais de direito tributário”, passa a dever, na
elaboração de leis, também, respeito às regras contidas no Código, às “normas
gerais em matéria de legislação tributária” 23.
Essa idéia de centralidade, por expansão concêntrica em relação à
Constituição, geradora de segurança24 para os partícipes da relação jurídica
tributária, aliada a uma pretensão de regular, por meio de cláusulas gerais, um
repertório de figuras e disciplinas típicas, com o fim de garantir à Fazenda
Pública maior certeza, celeridade e eficiência na percepção dos créditos
tributários; e aos particulares, os meios necessários para que estes possam
fazer valer os seus direitos, baliza a natureza dos códigos e de qual deve ser o
modo de compreensão da sua ação em relação às demais leis e atos
tributários em geral.
relaciones entre los sujetos que rodean el fenómeno tributario y sus consecuencias económicas
y jurídicas, a los cuales denominamos como operadores del Sistema Tributario”. BRAVO
CUCCI, Jorge Antonio; BRAVO SHEEN, David Enrique. Analisis y propuestas de cambio al
codigo tributario peruano: su adecuacion a las tendencias que inspiran el fin de siglo. Lima:
inédito, p. 1;
23 Como bem salienta o Prof. Ferreiro Lapatza: “(...) el Código ha de contener también,
de acuerdo con la experiencia común a nuestros países, la normativa general o básica de
todas las relaciones directamente derivadas del tributo y la normativa general o básica del
procedimiento para hacer efectivos los derechos y obligaciones que dan contenido a estas
relaciones, con la definición de los conceptos propios del Derecho Tributario indispensables
para toda esta regulación pues, de acuerdo asimismo con nuestra experiencia, uno de sus
fines primarios es introducir certeza, precisión y claridad en la terminología a emplear en las
Leyes, que regulan los distintos tributos”. FERREIRO LAPATZA, José Juan. La codificación en
América Latina – Análisis comparativo de los modelos OEA/BID (1967) y CIAT (1997) –
Relatorio Generale. Anais das XX Jornadas do ILADT. Salvador: ABDF, 2000, dez., p. 1182;
Nessa mesma linha, afirma também o Prof. Eusebio González: “(...) la codificación suele
proceder a una regulación de los conceptos tributarios fundamentales de los distintos
impuestos, esto es, de aquellos conceptos que inexcusablemente han de repertirse en cada
figura tributaria concreta (hecho imponible, sujeto pasivo, base imponible, liquidación, tipo
impositivo y cuota, fundamentalmente), por ello se dice que la codificación en cuestión opera en
el area de los principios”. GANZÁLEZ GARCÍA, Eusebio. Los principios generales de la
imposición y la codificación tributaria. Anais das XX Jornadas do ILADT. Salvador: ABDF,
2000, dez., p. 1647;
24 “La sicurezza non riguarda il raggiungimento del fine (legato sempre alle incognite
del mercato ed al mutevole mondo della produzione), ma le ‘regole del gioco’, ossia le
condizioni per le quali ciascuno può contare su un dato contegno altrui o attendere un certo uso
del potere coercitivo dello Stato. Il diritto fissa appunto le regole del giuoco: regole generali ed
astratte, che saranno utilizzate da persone ignote, per scopi ed in circonstanze particolari che
non conosciamo né siamo in grado di conoscere”. IRTI, Natalino. L’età della decodificazione. 3ª
ed., Milano: Giuffrè, 1989, p. 5;
18
Todavia, trabalharíamos fora da realidade se não tomássemos em conta
a crescente “erosão” da importância dos códigos modernos, sob os mais
diversos ângulos25. A codificação, que foi sempre considerada como um dos
processos mais acabados do iluminismo e da cultura ocidental moderna, e cujo
produto, os códigos, sempre funcionou como paradigma sistêmico da
legislação e da aplicação normativa, entrou em crise com a tendência
microssistêmica do direito, de leis especiais que passaram a regular
amplamente toda uma específica matéria, de tal sorte que o monossistema
teria sido superado pelo plurissistema, por uma espécie de êxodo normativo
daquele para este. É o que certos autores chamam de “descodificação”, fruto
da crise dos valores da sociedade moderna.
Mas se isso se verificou em alguns ramos jurídicos, o do direito civil por
exemplo, nos limites do direito tributário não alcançou maior importância,
exatamente porque a “crise legislativa”, nos angustos limites dessa seara,
possui distinta significação26, na medida que a inflação legislativa, acumulando
leis e mais leis sobre a matéria, razão da “descodificação” em outras,
apresenta-se exatamente como motivo para o enaltecimento da importância e
necessidade de codificação27, como elemento de estabilização e segurança
nas relações tributárias.
3.1 Codificação e segurança jurídica: a função certeza dos códigos
A virtude da codificação é servir aos princípios de segurança e certeza
do direito, em face da sua forma de comparecimento na teoria das fontes do
25 Cfr.: RAMOS NÚÑEZ, Carlos. Codificación, tecnologia y postmodernidad – la muerte
de un paradigma. Lima: PUC - Peru, 2000, p. 23 e ss.; Também: RAMOS NÚÑEZ, Carlos. El
Código napoleónico y su recepción en América Latina. Lima: PUC - Peru, 1997, p. 44 e ss.;
26 Tomando em conta a inquestionável importância dos códigos, mesmo em épocas de
descodificação, diz Ramos Núñez: “Si la centralidad y el protagonismo de los códigos han
cedido ante la acelerada producción normativa de carácter especial, éste parece ser un dato
más bien registrado por el jurista con sensibilidad sociológica, antes que por los finos cultores
de la dogmática y su numeroso séquito de abogados, jueces y estudiantes. A la vez que se
habla de la crisis de los códigos, se publican colecciones completas y se organizan congresos,
seminarios, simposiums y cértamenes de todo tipo, destinados a exaltar hasta el delirio las
bondades técnicas de un Código dado o para poner en tela de juicio sus imperfecciones.
Contra lo que pudiera pensarse, en una era de apogeo de los microsistemas y de predominio
de la tecnología, las ediciones se agotan y los auditorios se repletan, lo que, por añadidura, no
podrá hacer nunca culquiera de las ramas que se independizaron de los códigos o que se
formaron al margen de éstos”. RAMOS NÚÑEZ, Carlos. Codificación, tecnologia y
postmodernidad – la muerte de un paradigma. Lima: ARA, 1996, p. 72;
27 Na Itália, país que não dispõe de um Código Tributário, nada obstante a aspiração de
vários autores, numa exigência que se vai reforçando a cada dia. Tratando dos problemas
dessa incompreensível ausência, diz Corrado Magnani: “L’accennato quadro normativo dá
luogo a gravi incovenienti facilmente identificabili: 1) nell’esistenza di regole differenti
oggettivamente ingiustificate con conseguenti problemi di legittimità costituzionale per
violazione del principio di uguaglianza; 2) nelle lacune riscontrabili nella disciplina
dell’accertamento di molti tributi, con conseguenti problemi di integrazione di essa mediante il
ricorso a ‘principi’ di controversa individuazione; 3) nell’inesistenza, comunque, di normeprincipio
senza le quali la soluzione di molte questioni di ordine applicativo presenta, come
attestato dalla giurisprudenza, oggettivi margini di incertezza”. MAGNANI, Corrado.
Accertamento tributario e codificazione. In: UCKMAR, Victor (Coord.). L’evoluzione
dell’ordinamento tributario italiano. Padova: CEDAM, 2000, p. 554;
19
direito em posição intercalar entre a Constituição e a legislação, como meio de
gerar maior estabilidade no câmbio de expectativas normativas.
A segurança jurídica visa a conferir previsibilidade na regular positivação
do direito, o que somente será atendido se houver certeza do direito28, i.e., a
exata determinação do conteúdo jurídico aplicável, e manutenção da
igualdade29 de tratamento por parte das autoridades competentes, nos
respectivos atos de aplicação do direito. Temos, assim, a segurança como
resultante de duas variáveis axiológicas que se complementam, a certeza e a
igualdade30.
Interessa-nos aqui, a função certeza da segurança jurídica, entendendose
por “certeza” a determinação permanente dos efeitos que o ordenamento
jurídico atribui a um dado comportamento, de modo que o cidadão saiba ou
possa saber, de antemão, a conseqüência jurídica de suas próprias ações. E
essa função é atendida pelos códigos, porquanto a tipificação (regulação
normativa de ação-tipo)31, tarefa que lhe é própria, constitui-se numa garantia
dessa certeza, ao pretender oferecer a indicação explícita dos tipos e demais
elementos compositivos da regra-matriz de incidência, o que acaba por reforçar
o alcance e conteúdo dos dispositivos constitucionais, pelo processo de
28 Eusebio Gozález, ao tratar desse princípio, menciona como manifestação típica
deste: “en primer lugar, la estabilidad del Derecho, en segundo término, el suficiente desarrollo
normativo dentro de la jerarquía de las fuentes, finalmente, la certidumbre sobre los remedios
jurídicos a disposición del contribuyente, caso de incumplirse las previsiones del
ordenamiento”. GONZÁLEZ GARCÍA, Eusebio. Relaciones entre los principios de seguridad
jurídica y legalidad. In: IBET. Justiça Tributária. SP: Max Limonad, 1998, p. 151;
29 “A desigualdade decorre também da injustiça sistêmica. A igualdade estará
comprometida se o sistema tributário não for justo em sua totalidade, com equilíbrio entre
impostos diretos e indiretos e entre princípios e valores”. TORRES, Ricardo Lobo. Os direitos
humanos e a tributação – imunidades e isonomia. RJ: Renovar, 1995, p. 269; Cfr. ATALIBA,
Geraldo. República e Constituição. SP: RT., 1985, p. 142; HERRERA MOLINA, Pedro M.
Capacidad económica y sistema fiscal. Madrid: Marcial Pons, 1998, p. 84-87; NABAIS, José
Casalta. O dever fundamental de pagar impostos, Coimbra: Almedina, 1998, p. 394-421;
também, o importante estudo: OSVALDO CASÁS, José. Seguridad jurídica, legalidad y
legitimidad en la imposición tributaria. In: IBET. Justiça Tributária. SP: Max Limonad, 1998, p.
329-413;
30 Para maiores considerações, Cfr.: FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Segurança Jurídica
- Normas Gerais Tributárias, Revista de Direito Tributário. SP: RT, 1981, no 17/18, p. 42;
31 Como ensina Paulo de Barros Carvalho, ao tratar do princípio da tipologia tributária,
enquanto princípio constitucional tributário: “No direito positivo brasileiro, o tipo tributário é
definido pela integração lógico-semântica de dois fatores: hipótese de incidência e base de
cálculo. Ao binômio, o legislador constitucional outorgou a propriedade de diferençar as
espécies tributárias entre si, sendo também operativo dentro das próprias subespécies”.
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 10ª Ed. SP: Saraiva, 1998, p. 116.
Por isso, ao tratar do princípio da estrita legalidade, acrescenta: “O veículo introdutor da regra
tributária no ordenamento há de ser sempre a lei (sentido lato), porém o princípio da estrita
legalidade diz mais do que isso, estabelecendo a necessidade de que a lei adventícia traga no
seu bojo os elementos descritores do fato jurídico e os dados prescritores da relação
obrigacional. Este plus caracteriza a tipicidade tributária” (1998, p. 114); Para uma apreciação
da aplicação dos “conceitos classificatórios”, ao invés da noção de “tipo”, no direito tributário,
cfr.: DERZI, Misabel de Abreu Machado. Direito tributário, direito penal e tipo. SP: RT, 1988,
302 p.;
20
positivação32.
Isso não quer dizer que os códigos tenham apenas um papel de
reiteração de matéria já previamente fixada pela Constituição. Atendendo à
função certeza, os códigos devem ampliar seus desdobramentos na regulação
do funcionamento do sistema tributário para permitir efetividade às regras
constitucionais, sem que isso signifique restringir direitos dos contribuintes,
limitando o que a Lei Maior ofertou sem limitações, ou ampliação de
competências estatais. Por isso, situar nos códigos matéria típica de direito
constitucional tem efeito meramente repetitivo do quanto já foi ali assentado.
Contudo, voltamos a enfatizar. O que acima se expôs não se dá em
todos os sistemas, principalmente quando a Constituição de um país não
contempla uma gama muito ampla de preceitos típicos de direito tributário,
quando então o código cumpre um papel fundamental no ordenamento: o de
veicular as “normas gerais de direito tributário”, os princípios e primados de
maior dimensão, além daquelas que já lhes são próprias, as “normas gerais em
matéria de legislação tributária”.
Vale lembrar que estamos trabalhando com o conceito mais amplo
possível de codificação, numa visão de direito comparado, envolvendo a
análise de constituições de países unitários e países com regimes federativos;
de constituições com ampla regulação do respectivo sistema tributário e de
constituições desprovidas de regras sobre essa matéria.
3.2 O equívoco da “descodificação” no direito tributário
Como foi dito acima, o protagonismo dos códigos continua a ser
questionado como modelo legislativo neste momento de produção acelerada
de legislações e constitucionalização de várias matérias, numa tentativa de
acompanhar a evolução do homem e dos seus valores, presentes numa dada
coletividade. Essa é uma das causas principais da chamada “descodificação”,
com grandes repercussões para a interpretação e aplicação do direito positivo.
Mas esse não é um fenômeno universal, em face do mundo jurídico, pois não
se trata de um fenômeno que se encontra instalado em todas as áreas do
direito como querem ou pensam alguns.
É certo que em países cuja Constituição estabelece o poder de tributar
ou a distribuição de competência tributária, identifica as espécies de tributos e
predispõe os princípios e limites à atividade tributária do Estado, fixando o
campo de possibilidades destas, como ocorre no Brasil, nesse caso, o código,
32 Como assinala C. García Novoa: “A la pretensión de definitividad de la norma hay
que unir la pretensión de estabilidad de la misma, expresión formal de la confianza del
ciudadano en el Derecho, lo que debe servir para reprobar los cambios normativos excesivos e
injustificados. Y finalmente, la plenitud de la norma. La regulación normativa ha de expresarse
de tal manera que la definición de los supuestos de hecho comprenda un ámbito de la realidad
normada lo más amplio posible, de forma que se aminoren las lagunas” GARCÍA NOVOA, C. El
principio de seguridad jurídica en materia tributaria, Madrid: Marcial Pons, 2000, p. 77. Parece
difícil para um sistema conseguir alcançar estes objetivos desprovido de um Código Tributário
estável e bem estruturado.
21
perde em importância, pela inexorável submissão deste à Constituição33,
dando-se, em certa medida, uma espécie de “esvaziamento” do Código, e por
conseguinte numa “descodificação” por “avocação” de matéria, mesmo se não
chegue ao alcance de desfigurá-lo e torná-lo desprovido de importância. Eis o
que poderíamos chamar de descodificação ascendente.
Além dessa forma de descodificação ascendente, do código para a
Constituição, temos a descodificação descendente: pela formação de
microssistemas de normas, no chamado “processo de expansão legislativa”,
cujos particularismos, aparentemente, superam as disposições do Código34.
Todavia, a codificação ter por reduzida sua importância não quer dizer
ter por eliminadas suas sobranceiras funções no sistema. E por isso mesmo tal
“descodificação” só ocorre de modo aparente, pois ambos, Constituição e
Código, ocupam-se de conteúdos diversos: aquela, das “normas gerais de
direito tributário”, definindo o poder de tributar e seus limites, bem como os
princípios gerais, e o código, das “normas gerais em matéria de legislação
tributária”, dispondo sobre as regras exigidas pela constituição para explicitar
as matérias tributáveis e gerar redução de divergências na configuração dos
mecanismos formais de exigibilidade dos tributos.
A constitucionalização da matéria tributária gera uma conseqüente
descodificação, mas só aparente, como foi dito. A construção dos elementos
compositivos da obrigação tributária, a caracterização do fato jurídico tributário,
a qualificação dos deveres formais, a demarcação dos contornos da sujeição
passiva, dos atos de lançamento e exigência do crédito, de suspensão e
extinção do crédito tributário, dos prazos de decadência e prescrição, da
Administração e da Fiscalização de tributos, além de outros preceitos
necessários para dar ensejo ao processo de positivação das regras
constitucionais, não encontram outro universo senão o do código tributário,
como o melhor lugar para constar e informar todo o conteúdo das leis dos
diversos tributos, como complemento dos dispositivos constitucionais e, desse
modo, fazendo-se um círculo concêntrico, a partir daquele núcleo
constitucional, que confere sistematização à matéria35, na construção do
33 “(...) es cierto que una ley ordinaria como la Ley General Tributaria no tiene como
función exclusiva o típica la de regular derechos y garantías fundamentales sino la de regular
los mecanismos jurídicos de aplicación de los tributos procurando, eso sí, que dicha regulación
sea respetuosa con los derechos y garantías constitucionales de los ciudadanos”. SOLER
ROCH, María Teresa. Reflexiones sobre la descodificación tributaria en España. Revista
Española de Derecho Financiero. 1998/97, p. 11;
34 Há países, como a Espanha, onde se observa uma tendência - aparentemente
transitória (espera-se) - à descodificação, por atos legislativos que regulam, de forma
separada, aspectos fundamentais da relação tributária. É o caso da “Ley de Derechos y
Garantías de los Contribuyentes”, nº 1, de 26 de fevereiro de 1998, cuja exposição de motivos
declara expressamente: “la regulación en un texto legal único dotará a los derechos y
garantías en él recogidos de mayor fuerza y eficacia y permitirá la generalización de su
aplicación al conjunto de las Administraciones tributarias, sin perjuicio de su posible integración
en un momento ulterior en la Ley General Tributaria en cuanto constituye el eje vertebrador del
ordenamiento tributario”.
35 “De norte a sul, seja o tributo federal, estadual ou municipal, o fato gerador, a
obrigação tributária, seus elementos, as técnicas de lançamento, a prescrição, a decadência, a
22
sistema tributário nacional.
Somente o Código, na qualidade de “norma geral”, pode ampliar a
estabilidade sistêmica desejada pela Constituição, devendo as demais leis
serem a ele também subordinadas, por necessária compatibilidade vertical de
conteúdo. Por essa razão, dizemos que só aparentemente tal hipótese de
descodificação pode ser alegada, porque as “normas gerais em matéria de
legislação tributária”, é que vão informar os valores que devem ser
obedecidos36, como garantia de segurança jurídica para os contribuintes,
ficando para as regras codificadas o papel ordenador dos procedimentos
formais de constituição, fiscalização, arrecadação e extinção do crédito
tributário, as quais deverão ser atendidas pela por qualquer outro subssistema
que se crie.
Como disse Aliomar Baleeiro: “Os fatos – para lembrar livro que faz
época – passam adiante dos Códigos. Mas os Códigos, mesmo condenados à
mutilação ou à ancilose do tempo, põem ordem, estimulam a elaboração do
estudo científico do Direito e facilitam a tarefa dos aplicadores e o
conhecimento das regras pelo povo, mormente em assunto impregnado de
tecnicismo como é o tributo moderno”37.
Enquanto em outros ramos é atual o discurso que discute a existência
de uma “descodificação”, como é o caso do Direito Civil; no Direito Tributário,
contrariamente, a codificação é um reclamo de segurança e certeza jurídica,
cujo aperfeiçoamento representa a melhoria de todo o sistema tributário vigente
em um dado país, ao permitir a construção de uma legislação harmônica,
dotada de regras claras e submetidas a critérios formais comuns38.
anistia, as isenções etc. obedecem a uma mesma disciplina normativa, em termos conceituais,
evitando o caos e a desarmonia. Sobre os prolegômenos doutrinários do federalismo
postulatório da autonomia das pessoas políticas prevaleceu a praticidade do Direito, condição
indeclinável de sua aplicabilidade à vida. A preeminência da norma geral de Direito Tributário é
pressuposto de possibilidade do Código Tributário Nacional (veiculado por lei complementar)”.
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 2ª ed., RJ: Forense,
1999, 801 p.;
36 “Na verdade, não é mais possível trabalhar com um conceito oitocentista de código.
(...) Alterado substancialmente esse quadro, isto não significa que deva ser rejeitado o conceito
de código, pois ele favorece a preservação dos valores essenciais do ordenamento jurídico. Até
porque o código não é apenas mais uma lei, mas um valor cultural do ordenamento jurídico. A
luta por sua manutenção constitui uma manifesta aplicação do princípio da continuidade. (...)
Acrescente-se que a preservação do código favorece a obtenção de uma maior certeza do
direito”. ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. Da codificação – crônica de um conceito. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 157;
37 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário brasileiro. RJ: Forense, 11ª ed., 1999, p. 19;
38 “O interesse da unidade nacional, a segurança e a comodidade dos contribuintes, a
eficiência da Administração clamam por essa codificação.” BALEEIRO, Aliomar. Direito
Tributário brasileiro. RJ: Forense, 11ª ed., 1999, p. 14 (este é o mais completo trabalho sobre
codificação do direito tributário brasileiro, às páginas 11-46); Como diz Ferreiro Lapatza: “Los
cambios muy frecuentes de la normativa y las normas demasiado minuciosas contribuyen a la
opacidad del Derecho y dificultan su aplicación. Atentan contra la claridad de la norma, privan
la certeza el ordenamineto y significan, por tanto, un ataque directo al principio de seguridad.
Principio que postula normas claras y sencillas y, en el medida de lo posible, estables, de tal
forma que los ciudadanos puedan, sin grandes esfuerzos, medir las consecuencias fiscales de
23
Por tal razão, é que na atualidade já se faz sentir um fenômeno inverso,
de recodificação, ou seja, de “devolução” de matérias aos códigos, dantes
subtraídas por legislação especial (pela “descodificação descendente”), com
natureza de princípios ou paradigmas imprescindíveis para a construção,
interpretação ou aplicação das demais normas do sistema. Como assinala
Ramos Núñez: “La recodificación no es un dato aislado que corresponda a la
experiencia política de un sólo país. En realidad, se trata de una tendencia que
se registra en todos los países de tradicion romanista”39.
No enfrentamento dos problemas relacionados com a suposta
“descodificação”, vemos que uma das hipóteses desta situação decorre da
relação entre a Constituição e o Código Tributário (descodificação ascendente),
que se não nos legitima a falar numa espécie de perda de conteúdo, ao menos
nos confere condições para dizer sobre uma perda de importância quando essa
Constituição, expressamente, não disponha sobre qual a posição hierárquica a
ser ocupada pelo Código no ordenamento jurídico. A ausência de um
dispositivo como esse enfraquece o Código, ao mesmo tempo que instaura um
clima de desconfiança sobre o efetivo alcance e a eficácia das normas nele
contidas. É o caso do Brasil, nada obstante o art. 146, da Constituição Federal,
cuja interpretação não tem recebido um sentido uniforme por parte da doutrina.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando tudo quanto foi dito acima, no atual quadro de exigências
de aperfeiçoamento da legislação tributária, particularmente do CTN,
precisamos isolar com clareza suas funções constitucionais no sistema jurídico
vigente.
A Constituição Federal (art. 146, III) exige que o sistema de legislações
(União, Estados, Distrito Federal e Municípios) submeta-se às chamadas
“normas gerais de direito tributário”, como forma de: regular as limitações
constitucionais ao poder de tributar, aplicando-se estritamente àquelas que
exigem lei específica para surtir efeitos (art. 146, II; 150, VI, “c”; 195, § 7º, 156,
§ 3º CF); ii) evitar eventuais conflitos de competência entre as pessoas
tributantes, quando deverá dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo e
contribuintes dos impostos já identificados na Constituição (art. 146, I e III, “a”;
155, § 2º, XII, CF); iii) definir os tributos e suas espécies (art. 146, III, “a”, CF);
iv) harmonizar os procedimentos de cobrança e fiscalização dos tributos,
tratando de obrigação, lançamento e crédito - art. 146, III, “b”, CF; e v)
uniformizar os prazos de decadência e prescrição - art. 146, III, “b”, CF.
Para criar tais normas gerais, o Congresso Nacional, na qualidade de
legislador nacional, deve usar de leis complementares, que são figuras do
ordenamento que se diferenciam dos demais atos legislativos por encontrarem
no sistema constitucional o respectivo campo material predefinido
sus actuaciones”. FERREIRO LAPATZA, José Juan. Ensayos sobre metodología y técnica
jurídica en el derecho financiero y tributario. Madrid: Marcial Pons, 1998, p. 29;
39 RAMOS NÚÑEZ (1996, p. 76);
24
(competência), sob a forma de matérias sujeitas ao princípio de reserva de lei
complementar (pressuposto material), e aprovadas por maioria absoluta
(pressuposto formal, art. 69, CF).
Desse modo, apreciando as hipóteses de cabimento de lei
complementar em matéria tributária, temos que, no ordenamento constitucional
vigente, são matérias de reserva de lei complementar, em duas das funções
legislativas do Congresso Nacional:
3) O exercício de competência da União (lei complementar federal), a
qual se subdivide em:
i) exercício de competências privativas específicas: arts. 148; 153, VII,
CF; e
ii) exercício de competência residual – arts. 154, I; 195, § 6º, CF;
4) A criação das normas gerais em matéria de legislação tributária (lei
complementar nacional – art. 24, I e 146, CF), as quais se encontram
expressas nas seguintes possibilidades:
vii) regular as limitações constitucionais ao poder de tributar,
restritamente àquelas que exigem lei específica para surtir efeitos (art. 146, II;
150, VI, “c”; 195, § 7º, 156, § 3º CF);
viii) evitar eventuais conflitos de competência entre as pessoas
tributantes, quando deverá dispor sobre fatos geradores, bases de cálculo e
contribuintes dos impostos já identificados na Constituição (art. 146, I e III, “a”;
156, III; 155, § 2º, XII, CF);
ix) definir os tributos e suas espécies (art. 146, III, “a”, CF);
x) harmonizar os procedimentos de cobrança e fiscalização dos
tributos, tratando de obrigação, lançamento e crédito (redução de divergências)
- art. 146, III, “b”; 155, § 2º, XII, CF;
xi) uniformizar os prazos de decadência e prescrição - art. 146, III, “b”,
CF.
No primeiro caso, o exercício da competência será legítimo se
acompanhado de lei complementar, por ser matéria reservada tipicamente para
essa espécie de lei. Exercida a competência, quer dizer, instituído o tributo, sua
função cessa, ingressando no sistema jurídico nacional no mesmo plano das
leis ordinárias e mantendo-se, assim, em relação de coordenação com estas.
Nesse caso, não há que se falar em qualquer hierarquia entre a lei
complementar e os demais atos legislativos, porquanto sua função exaure-se
com a instituição do tributo, cessando com o próprio exercício de competência.
Por conseguinte, nada impede que lei ordinária posterior modifique ou mesmo
ab-rogue lei complementar com tais funções.
Corolário dessa conclusão, somente lei complementar, na função de
“norma geral”, poderá revogar uma outra “norma geral”. Não basta ser lei
25
complementar, portanto. É preciso que esteja dirigida para o fim de modificar a
norma com essa função no ordenamento.
Evidente, pois, que não estando a razão de hierarquia na vigência ou na
eficácia da norma, a única posição questionável será aquela do plano da
validade. Por isso mesmo, tomando em conta a natural submissão do Código
aos preceitos constitucionais, independentemente de se tratar de uma lei
ordinária, a Lei nº 5.172/66, enquanto “lei nacional” que é, naquilo que for
fundamento de validade material para a construção da legislação do “sistema
tributário nacional”, terá preeminência sobre todas as demais leis, ordinárias ou
complementares, não importa, elaboradas por qualquer uma das pessoas
políticas.
Referência Bibliográfica deste Artigo (ABNT: NBR-6023/2000):
TÔRRES, Heleno Taveira. Funções das leis complementares no sistema tributário
nacional – hierarquia de normas - papel do CTN no ordenamento. Revista
Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, nº. 10, janeiro,
2002. Disponível na Internet: . Acesso em: xx
de xxxxxxxx de xxxx
(substituir x por dados da data de acesso ao site).
Publicação Impressa:
Informação não disponível.

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