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sexta-feira, 28 de outubro de 2011

INFORMATIVO 645 STF

PAD e vinculação à decisão da comissão processante (Transcrições)

(v. Informativo 644)

RMS 24619/DF*

RELATOR: Min. Gilmar Mendes

Relatório: Trata-se de recurso ordinário em mandado de segurança contra decisão do Superior Tribunal de Justiça, ementada nos seguintes termos:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR DEMISSÃO. NULIDADES. INCOMPETÊNCIA DA AUTORIDADE. FALTA DE INTIMAÇÃO PESSOAL DA DECISÃO. DESCONEXÃO ENTRE OS FATOS APURADOS E A PUNIÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. ALEGAÇÕES FINAIS. SUPRESSÃO DO DIREITO AO RECURSO.
I - Não há nulidade na demissão por incompetência da autoridade impetrada, se o ato fora praticado no exercício de poder delegado expressamente pelo Presidente da República, contida no Decreto 3.035/99.
II - Se o ato demissório está baseado nos fatos que foram apurados ao longo do processo disciplinar, dos quais pôde o servidor tomar conhecimento e se manifestar. apresentando sua versão, não há que se falar em cerceamento de defesa.
III - A falta de intimação pessoal do indiciado da decisão ministerial não constitui vício absoluto, e não tem o condão de, por si só, anular a punição, se há demonstração inequívoca de que o servidor tomou ciência do ato, restando sanada tal falha.
IV - A Lei 8.112/90, ao estabelecer regulamentação específica para o processo disciplinar dos servidores públicos por ela regidos, admite aplicação apenas subsidiária da Lei 9.784/99. Se não há previsão na Lei 8.112/90 para o oferecimento de alegações finais pelo acusado antes do julgamento, não cabe acrescentar nova fase no processo para tal fim com base na lei genérica.
V - É incabível a alegação de cerceamento de defesa por supressão do direito ao recurso na via administrativa, se há previsão expressa na Lei 8.112/90 possibilitando ao servidor apresentar pedido de reconsideração do decisum e recurso para a autoridade hierarquicamente superior.
Segurança denegada”. (fl. 217)

No recurso ordinário, sustenta-se que o processo administrativo disciplinar, que culminou com a demissão do recorrente, não observou os princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, da legalidade, da razoabilidade e da finalidade.
O recorrente salienta que “nem todo procedimento equivale ao Devido Processo Legal. O respeito ao procedimento estabelecido, tomado isoladamente, não se confunde com o Devido Processo Legal como se poderia crer. Deste modo, o respeito apenas à forma definida em lei não é suficiente para que se cumpra o princípio constitucional”. (fl. 254)
Aduz, ainda, que o ato de demissão foi ilegal, tendo em vista “o não acatamento das conclusões da Comissão pela autoridade julgadora, a falta de notificação da portaria ao recorrente e total ausência de fundamentação do ato administrativo de demissão”. (fl. 255)
Assevera a incompetência do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão para aplicação da penalidade de demissão do servidor, ante a ilegalidade da delegação.
A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pelo improvimento do recurso (fls. 271-274). Confira-se a ementa:

RECURSO ORDINÁRIO – MANDADO DE SEGURANÇA – SERVIDOR PÚBLICO – SUDAM – PROCESSO ADMINISTRATIVO – APRESENTAÇÃO DE DEFESA ESCRITA – PENA DISCIPLINAR DE DEMISSÃO – COMPETÊNCIA DA AUTORIDADE COATORA – DECRETO N. 3.035/99 – ALEGAÇÃO DE CONTRARIEDADE AOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE, RAZOABILIDADE, DA FINALIDADE, DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO – PRETENSÃO DO REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO – IMPOSSIBILIDADE – PRECEDENTES DO STF – PARECER PELO IMPROVIMENTO DO RECURSO”.

É o relatório.

Voto: Inicialmente, ressalto que esta Corte firmou entendimento no sentido de que Ministro de Estado tem competência para aplicar pena demissão a servidor em virtude de condenação em processo administrativo disciplinar, tendo em vista o disposto no art. 84 da CF e no Decreto 3.035/1999. Confiram-se alguns precedentes:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. ALEGAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA DA AUTORIDADE COATORA. DECRETO Nº 3.035/99. Nos termos do parágrafo único do art. 84 da Magna Carta, o Presidente da República pode delegar aos Ministros de Estado a competência para julgar processos administrativos e aplicar pena de demissão aos servidores públicos federais. Para esse fim é que foi editado o Decreto nº 3.035/99. Facultado ao servidor o exercício da ampla defesa, e inexistente qualquer irregularidade na condução do respectivo processo administrativo disciplinar, convalida-se o ato que demitiu o acusado por conduta incompatível com a moralidade administrativa. Recurso ordinário desprovido”. (RMS 25367, Rel. Min. CARLOS BRITTO, Primeira Turma, DJ 21.10.2005)

1. Demissão: ocupante do cargo de Policial Rodoviário Federal: processo administrativo disciplinar que se desenvolveu validamente, assegurados ao acusado o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. 2. Presidente da República: competência para prover cargos públicos (CF, art. 84, XXV, primeira parte), que abrange a de desprovê-los a qual, portanto é susceptível de delegação a Ministro de Estado (CF, art. 84, parágrafo único): validade da Portaria do Ministro de Estado que – à luz do Decreto 3.035/99 , cuja constitucionalidade se declara – demitiu o recorrente”. (RMS 24128, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Primeira Turma, DJ 1º.7.2005)

Além disso, o recorrente aduz cerceamento de defesa, em virtude da ausência de intimação pessoal da pena de demissão imposta pela Portaria n. 17/2002. Contudo, registre-se que o recorrente teve plena ciência do conteúdo da mencionada Portaria por intermédio de sua publicação no Diário Oficial da União no dia 25 de janeiro de 2002.
Ressalte-se, ainda, que a publicação na imprensa oficial é a comunicação adequada para o ato, sendo desnecessária a intimação pessoal do acusado. Nesse sentido, confira-se o entendimento desta Corte:

“RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DEMISSÃO. IRREGULARIDADES. INCLUSÃO DE NOVOS FATOS NA ACUSAÇÃO. RESPEITO AO CONTRADITÓRIO. POSSIBILIDADE DE ENCAMPAÇÃO DOS TERMOS DO PARECER CONSULTIVO PELA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA SUPERIOR, SEM VINCULAR O ÓRGÃO JULGADOR. INTIMAÇÃO DOS SERVIDORES PELA IMPRENSA OFICIAL. LEGALIDADE. RECURSO IMPROVIDO. 1. Não há ilegalidade na ampliação da acusação a servidor público, se durante o processo administrativo forem apurados fatos novos que constituam infração disciplinar. O princípio do contraditório e da ampla defesa deve ser rigorosamente observado. 2. É permitido ao agente administrativo, para complementar suas razões, encampar os termos de parecer exarado por autoridade de menor hierarquia. A autoridade julgadora não está vinculada às conclusões da comissão processante. Precedentes: [MS n. 23.201, Relatora a Ministra ELLEN GRACIE, DJ de 19.08.2005 e MS n. 21.280, Relator o Ministro OCTAVIO GALLOTTI, DJ de 20.03.92]. 3. Não houve, no presente caso, ofensa ao art. 28 da lei n. 9.784/98, eis que os ora recorrentes tiveram pleno conhecimento da publicação oficial do ato que determinou suas demissões em tempo hábil para utilizar os recursos administrativos cabíveis. 4. Não há preceito legal que imponha a intimação pessoal dos acusados, ou permita a impugnação do relatório da Comissão processante, devendo os autos serem imediatamente remetidos à autoridade competente para julgamento [arts. 165 e 166 da Lei n. 8.112/90]. Precedente: [MS n. 23.268, Relatora a Ministra ELLEN GRACIE, DJ de 07.06.2002]. Nego provimento ao recurso ordinário”. (grifei) (RMS 24526, Rel. Min. Eros Grau, Primeira Turma, DJe 15.8.2008)

Por outro lado, a Lei 8.112/90 autoriza que autoridade julgadora altere a penalidade imposta ao servidor pela comissão processante, desde que sua decisão esteja devidamente fundamentada, in verbis:

Art. 168. O julgamento acatará o relatório da comissão, salvo quando contrário às provas dos autos.
Parágrafo único. Quando o relatório da comissão contrariar as provas dos autos, a autoridade julgadora poderá, motivadamente, agravar a penalidade proposta, abrandá-la ou isentar o servidor de responsabilidade”.

Nesse mesmo sentido, encontra-se a jurisprudência desta Corte:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. AGRAVAMENTO DE PENALIDADE. DISCREPÂNCIA ENTRE A PENALIDADE APLICADA POR MINISTRO DE ESTADO E AS CONCLUSÕES DA COMISSÃO DISCIPLINAR. Ato de ministro de Estado que aplica penalidade de suspensão por noventa dias. Agravamento em relação à penalidade de advertência indicada no relatório de comissão disciplinar. Fundamentação insuficiente. Leitura do art. 168 da Lei 8.112/1990. O art. 168 da Lei 8.112/1990 não obriga a autoridade competente a aplicar a penalidade sugerida no relatório de comissão disciplinar, mas exige, para o agravamento dessa pena, a devida fundamentação. Nesse sentido, vencido o ministro relator, que dava parcial provimento ao recurso para restabelecer pena de advertência. Por maioria, recurso ordinário conhecido em parte, afastadas as demais alegações de nulidade, e, nessa parte, provido, para anular o ato impugnado, sem prejuízo de que outro venha a ser praticado com a devida fundamentação”. (grifei) (RMS 24561, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. p/ Acórdão: Min. Joaquim Barbosa, Primeira Turma, DJ 18.6.2004)

No caso, o Ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão concluiu, em decisão satisfatoriamente fundamentada e com respaldo no Parecer emitido pela Consultoria Jurídica do respectivo órgão (fls.145-150), que as provas constantes dos autos se referem a conduta desidiosa, à qual deve ser aplicada pena de demissão e não apenas a sanção de advertência.
Ressalte-se que a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que é legítimo à “autoridade competente para a prática de um ato motivá-lo mediante remissão aos fundamentos de parecer ou relatório conclusivo elaborado por autoridade de menor hierarquia” (MS 25518, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, DJ 10.8.2006)
Nessa esteira, relevante a transcrição de trecho do Parecer da PGR, que bem delineou a questão:

Quanto à suposta total ausência de fundamentação do ato administrativo de demissão, além de a alegação se mostrar inconsistente quanto ao que consta da portaria de demissão em si (por proceder de forma desidiosa, consistente em reiteradas vezes emitir, indevidamente, pareceres favoráveis à continuidade de aporte de recursos financeiros à Companhia de Mecanização da Amazônia – CMA, apesar de terem sido constatadas diferenças entre o resultado das fiscalizações procedidas e o projeto da empresa aprovado junto à SUDAM, além de não haver diligenciado no sentido de exigir todos os elementos necessários ao controle físico, contábil e financeiro do empreendimento fiscalizado, conforme lhe facultava o art. 44, § 1º, da Resolução CONDEL/SUDAM n. 7.077/91, em especial a simples solicitação de extrato bancário do Banco do Estado da Amazônia S.A. – BASA para comprovação da aplicação dos recursos financeiros, conforme exigido pelo Parecer da Secretaria Executiva da SUDAM que antecedeu ao reenquadramento da CMA à nova sistemática de benefícios fiscais, introduzida pela Lei n. 8.167, de 16 de janeiro de 1991, justamente nos períodos em que houve o maior volume de falsificações documentais e o maior repasse de recursos financeiros à empresa), o certo é que a autoridade apontada como coatora também encapou os termos do PARECER/CONJUR/RA/MP n. 0038-3.9/2002, procedimento que encontra apoio na jurisprudência desse Pretório Excelso (AI-AgR 237.639, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 19.11.99), no sentido de que nada impede a autoridade competente a prática de um ato de motivá-lo mediante remissão aos fundamentos do parecer ou relatório conclusivo elaborado, como na espécie, por autoridade de menor hierarquia’”. (fls. 273-274)

Assim, a decisão proferida pela autoridade apontada como coatora está devidamente fundamentada, não padecendo de irregularidades.
Ademais, o mandado de segurança não se presta a resolver questões fáticas, em razão de não admitir dilação probatória, motivo pelo qual exige a demonstração incontroversa dos fatos e provas, de forma pré-constituída, para a caracterização do direito líquido e certo. Confira-se:

Mandado de Segurança. Servidor Público. Processo Administrativo. Pena disciplinar de demissão. Alegação de decisão contrária às provas dos autos e consequente desvio de finalidade do procedimento. Pretensão de reexame do conjunto fático-probatório coligido no processo disciplinar inconciliável com o rito do writ. Recurso ordinário a que se nega provimento”. (RMS 23988, Rel. Min. ELLEN GRACIE, Primeira Turma, DJ 1º.2.2002)

Nesses termos, nego provimento ao presente recurso. 

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